21 novembro 2010

HORTO FLORESTAL




Orgulhosíssima do meu marido... Leiam txt dele abaixo sobre o Horto Florestal e, por favor, divulguem para todas as redes/listas sociais e mídias alternativas que puderem. O Globo não pode ficar com o monopólio da informação pautando os outros meios. Temos que criar/conectar canais de comunicação entre os que pensam com ideário diferente nas questões de nossa cidade/ polis, país, vida...

Abs
Laura.

Amigos,

Escrevi o texto a seguir com revisão da Laura em resposta ao artigo ignóbil publicado naquele tablóide local. Não havendo objeções, gostaria de publicar no site da Amahor e divulgar em minha rede.

Grande abraço,

- Julio




Solução conciliada para o Horto esbarra no preconceito e na ignorância

A matéria "Que belo horto para plantar favela", publicada no Globo (19 de novembro de 2010) e assinada por Marcos Sá Corrêa, pretende desmontar o texto "Solução conciliada para o Horto" (O Globo, 16 de novembro de 2010) do deputado federal Edson Santos. Edson Santos apresenta conciso e eficiente resumo e proposta conciliatória para uma questão fundiária urbana que vem ganhando na mídia nativa desproporcional interesse, visto que se trata da regularização de aproximadamente 600 moradias no entorno do parque Jardim Botânico, em área historicamente conhecida como Horto Florestal.

Edson Santos
Marcos Sá despeja sobre o leitor uma série de ataques ao deputado e à comunidade centenária do Horto Florestal, embasados em obscura carga preconceituosa. A pretensão do autor, no entanto, se esvai logo no início de seu equivocado e desconexo texto. Ao afirmar já na primeira frase que o deputado é "veterano de lutas contra o patrimônio público no Rio de Janeiro", exige do leitor um salto digno de um recordista olímpico para transpor o abismo entre o "achismo", travestido de "opinião", e a dialética.

Não se espera do autor qualquer apreço à informação e muito menos o embasamento necessário para produção de uma opinião, como o conhecimento mínimo sobre a localidade e sua história, que remonta aos tempos coloniais. Marcos Sá discorre que "moradores" e "Horto Florestal" constituem um oximoro, presume-se por que o nome "Florestal" impingiria à região uma prerrogativa de uso que inviabilizaria a moradia, mesmo que histórica. Sendo assim, fico a procurar o "jardim" de "Jardim Botânico" em meio à poluída e caótica extensão de um bairro mal cuidado.

Marcos Sá Corrêa
A partir daí, o texto envereda perigosamente para o reducionismo de uma questão complexa, palpites jurídicos sem conhecimento algum de causa e, pior, com a externalização do preconceito da imprensa nativa, cada vez mais desnudado. Sem pudor ou constrangimento, Marcos Sá reduz moradores a "invasores" e "espertos" que "procriam", como gado. Replica triste argumento de Carlos Prates da RBS, filiada à Globo, no qual "denuncia" a multiplicação dos carros para os "miseráveis" que hoje se sentem no direito de serem cidadãos. Ignora relatos de moradores com mais de 80 anos que nasceram na localidade, cujos avós já trabalhavam e moravam ali, remontando a uma ancestralidade e pertença histórica de mais de 120 anos.

Tal ignomínia vem subsidiando um movimento pela nova higienização social do Rio de Janeiro, pautada por ideário obscurantista que visa desconstruir os avanços institucionais alcançados desde a redemocratização. Esta nova higienização se da com ações arbitrárias e opacas de despejo em diversos pontos da cidade, que se aceleram na mesma medida da aproximação dos "grandes" eventos de 2014 e 2016. Exemplo contundente foi a demolição sumária pela prefeitura de centenas de casas a toque de caixa na Ladeira dos Tabajaras, ação posteriormente impedida por liminar que corretamente interpretou os preceitos constitucionais do direito à moradia digna. No episódio, a prefeitura deixou como legado um verdadeiro cenário de desolação, onde os "sobreviventes" e as crianças miseráveis compartilham espaço com entulho, cacos, ratos e outras pestes, criando uma situação de calamidade pública que o Globo não se dignou a denunciar.

A cobiça da especulação imobiliária se sobrepõe à própria história do Rio de Janeiro, da qual é peça integrante a comunidade do Horto Florestal. O poder do capital, no entanto, tem pouca afeição à preservação. Mais lucrativa é a proliferação de shoppings e prédios que se assemelham a banheiros públicos, revestidos de pastilhas e com arquitetura de gosto duvidoso e muito, muito blindex. Talvez seja esta a imagem que Marcos Sá vislumbre ser desejada por turistas que se multiplicarão nos próximos anos - uma cidade "limpa" de seus pobres com espaços artificiais e uma história enterrada bem no fundo do preconceito latente e agora externo do "feliz e cordial" povo carioca, para não se dizer o contrário. Esta é a verdadeira cidade partida onde diálogo, paz e a resolução democrática de conflitos são subjugados pela arbitrariedade, preconceito e pelo ódio como o proferido por Marcos Sá.

Retornando à sua diatribe, o autor pretende associar a vitória de Edson Santos no pleito para a Câmara ao apoio das "invasões". "Elege-se em parte com o apoio delas", afirma, ignorando o fato de que mais de cinquenta mil cidadãos votaram no deputado. A este ponto, o leitor, fatigado com malabarismos, rende-se à verdade: trata-se de um texto panfletário, mais adequado a uma conversa de botequim do que impresso em papel. Não é de se surpreender que o Globo vai muito "aquém" do papel de um jornal, não cobrindo sequer o custo de sua reciclagem.

Mas a coroação do texto vem em seu último parágrafo onde o autor veste o manto de "especialista" em botânica, misturando as funções e destinações do Instituto de Pesquisas Jardim Botânico e do arboreto, equivocadamente classificado como "laboratório a céu aberto". Sua confusão pode ser perdoada como a ignorância de um leigo sobre o rigor exigido da pesquisa científica, onde não se pode misturar um ambiente de visitação destinado ao mostruário de respeitável acervo botânico com pesquisa botânica de base. O laboratório a que se refere, na verdade, é o conjunto de biomas que se estendem pelo território nacional em diversidade cujo instituto, isto sim, se propõe a estudar e catalogar.

Quanto ao arboreto, aos poucos transfigurado em um parque temático, já tendo há muito ultrapassado sua capacidade de suporte a visitantes, perde progressivamente a sua fauna e flora pelo descaso de uma administração mais propensa a derrubar árvores do que encontrar soluções "botânicas" para salvaguardar suas estruturas. Um passeio dentro do arboreto ao largo do Rio dos Macacos revela um cenário assustador onde dezenas de árvores foram derrubadas, muitas das quais recentemente. Mais a diante, próximo à Escola Julia Kubitschek, cuja história a administração do parque tenta aniquilar, encontra-se agora um canteiro de obras com montes de cimento e areia, usados para nivelar as vias do parque numa potente e perigosa mistura, assentada através de máquinas ruidosas que expelem densa fumaça tóxica. Isto sem falar no total desrespeito e no risco à saúde das crianças que estudam ao lado deste canteiro perverso. Já próximo ao SERPRO, o Jardim Botânico ergue uma enorme construção que devastou mais de dois mil metros quadrados de mata secundária. Estes são apenas alguns exemplos do espírito preservacionista e botânico da administração do parque. Por sua vez, a comunidade do Horto sempre serviu como zona de amortecimento entre a floresta e o asfalto, e agora, entre a floresta e o parque expansionista e invasor.

O real perigo que enfrentamos com a aproximação dos eventos é a desvirtuação por ditos especialistas instantâneos dos reais problemas da cidade quanto a questões como moradia, respeito aos cidadãos e preservação ambiental. Resta ao leitor constatar o verdadeiro oximoro, ao que Marcos Sá Corrêa subscreve-se "jornalista".

Julio Feferman
Biólogo

2 comentários:

Rafael Rodrigues disse...

Prezado Júlio,
Parabéns pelo artigo. Suas informações vão subsidir parte da resposta que estamos redigindo ao "jornalista" Marcos Sá Corrêa, que deveria ter mais apreço a figura de seu pai, o respeitabilíssimo Villa Boas Corrêa.
Aliás, que jornalismo é este que houve apenas um lado da questão? Em matéria publicada em O Globo de hoje (22.11), Edson apanha novamente sem ter sido ouvido para contestar. Isso não é jornal, é panfleto!
Cordialmente,
Rafael Rodrigues
Mandato Edson Santos

ferri disse...

Em defesa dos Moradores do Horto

Confesso que tenho evitado comentar o litígio fundiário que envolve a comunidade do Horto e a atual direção do Jardim Botânico, para não partidarizar a questão. Da mesma forma, tento não polemizar com lideranças da AMA-JB. Entendo que eles buscam exercer com legitimidade a representação de parte dos moradores do bairro que não se conforma com a presença de uma comunidade pobre em área limítrofe ao Jardim Botânico. Mas o fato é que meu nome e minha figura estão indissociavelmente ligados aquela comunidade, rendendo a mim citações e ataques constantes por parte dos opositores. Situação que parece se intensificar na medida em que se aproximam as próximas eleições municipais, em nítida demonstração de que o debate está contaminado pelo processo eleitoral.

Por este motivo resolvi postar na rede uma mensagem sobre a questão, para que os interessados possam formar juízo sobre o assunto tendo também como base o meu ponto de vista.

[Publicação completa no Blog do Rodrigo Abel]

http://bit.ly/M75mDY