30 julho 2006

CASO SUZANE E DANIEL - UNIDOS PELO ESPELHO E PRESOS PELO OLHAR

Por Silas Cabral Bourguignon

A propósito dos crimes noticiados pela mídia nos últimos meses e anos no Brasil, que envolvem filhos, pais, avós, namorados entre outros familiares, vamos recortar e trazer à luz, como lugar de reflexão, o bárbaro crime cometido em São Paulo por Suzane, na companhia de seu namorado, e o irmão deste. O que poderia tê-los levado a esta passagem ao ato, sem que nada da ordem simbólica pudesse ter remediado este enigmático e brutal crime?

Consta, pelas poucas informações que obtivemos na mídia, que Suzane Louise, além de bela, rica de família abastada, era uma moça pacata, discreta em seus hábitos, de poucos amigos, e que, até este crime, nada havia que pudesse indicar a possibilidade de um comportamento de tal natureza.

O episodio foi aterrorizante e podemos pensá-lo sob alguns aspectos gerais, sem que possamos, em nosso encaminhamento, garantir qualquer opinião, ate porque, se assim tivéssemos condições de fazê-lo, teríamos que tê-la escutado, e a seus pares, na particularidade da clínica psicanalítica, e aí, estaríamos eticamente impedidos de trazer qualquer comunicação em público.

Trata-se de um processo constitutivo nada pacifico. Ao contrario, o estádio (arena) do espelho configura-se também pelo horror do jogo especular imaginário, quando o pai se coloca no lugar de outro rival, o primeiro outro fora da relação mãe-filho, que vem para instaurar a lei, e, portanto, outro ao qual a criança vai manter de certa forma, neste período relativo ao segundo tempo do Complexo de Édipo, uma relação de agressividade, mas ao qual a criança vai também se identificar, quando passa a entender o desejo e ausências da mãe relativamente à figura (lei) paterna. Então, o bebe na identificação que faz com o pai, em um segundo momento, ao se ver no espelho, pensa que o eu é o outro paterno, seu semelhante, e rivaliza com sua própria imagem, pois “o eu é um outro”. A descoberta de ser como o outro, seu semelhante, gera uma disputa de vida e morte, pois desejam o mesmo objeto, ou seja, no caso do bebe, a mãe. Desta forma, na luta pelo objeto do desejo, alguém deve ser aniquilado, simbolicamente, pois, neste lugar não podem coabitar dois.

Suzane von Richthofen foi condenada a 39 anos de prisão por ter participado da morte dos pais.

Para seus advogados de defesa a pena deveria ter sido menor, pois ela estaria sob domínio do então namorado, Daniel Cravinhos (também condenado juntamente com o irmão), tese rejeitada pelos jurados que entenderam que ela poderia ter resistido embora tivesse sido “alvo de coração”. Alega ainda a defesa de que Suzane estava subjugada e em situação “anormal” ao cometer o crime.

O que podemos perguntar é: o que é situação “anormal”, ou situação “normal”?

Diante dos crimes noticiados recentemente no Brasil, envolvendo pais, filhos avos e outras relações de parentesco próximas, o psicanalista Silas Cabral Bourguignon, procura desvendar o que teria levado o casal Suzane e Daniel a ultrapassar os limites da fantasia e sem nada que pudesse remediar a ordem simbólica, passar ao ato brutal.

O artigo “Caso Suzane e Daniel, unidos pelo espelho e presos pelo olhar”, publicado no Jornal Gradiva, tem por função colocar em questão o encaminhamento que o discurso científico, médico psiquiátrico, tem dado a esse crime. O artigo coloca em questão estes aspectos que perdem importância na medida em que sua reflexão faz emergir aquilo que no âmbito das aparências e das imagens não é passível de um simples entendimento, além do fato de poder demonstrar que a vida possui um equilíbrio instável, principalmente quando o sujeito está superficialmente ancorado em identificações imaginárias, faltando-lhe ou estando em carência do suporte referencial simbólico do Outro paterno.

Rogério Silva

Um comentário:

Anônimo disse...

Quando você fala do "Outro paterno", acho que você está apoiado em Lacan. Eu não entendo muito o que isto quer dizer, mas penso numa autoridade paterna que comparece mal. Me chamou a atenção que o irmão, que na época tinha 15 anos, logo perdoou a irmã. Como é isso, um irmão, menor de idade, perde pai e mãe (mortos) e ainda a única irmã (viva e presa como culpada da morte dos pais), e de saida perdôa a irmã.
Como seriam esses pais?
Essa aí eu acho que nem Freud Explica!...