24 maio 2006

PAULICÉIA DESVIADA

Por Rogério Silva

Falar de uma semana de acontecimentos em São Paulo me vem logo à lembrança a Semana de Arte Moderna de fevereiro de 1922, cujo único óbito relatado foi o “atestado de óbito da arte dominante”. O academicismo plástico, o romantismo musical e o parnasianismo literário, receberam ali o golpe fulminante. Foi um ato de mudança que deu início a um período de livre experimentação e pesquisa na busca de uma arte nacional, resgatando a realidade brasileira e a sua atualização com as vanguardas européias.

Um dos pontos de destaque daquela semana foi a criação de Paulicéia Desvairada, por Mario de Andrade. Na obra encontramos uma mistura do poeta com o significado da metrópole. O dilaceramento do poeta resultante das tensões sociais que o rodeiam. De um lado, sua linhagem social o compromete com um passado hierárquico; por outro, ele compreende o valor do novo, o efeito espetacular da industrialização, o papel empreendedor dos imigrantes e a democratização da vida urbana.

A diferença daquela semana para a semana de onda de violência liderada pelo PCC vivida pela paulicéia com ataques a alvos policiais e rebeliões simultâneas em todo o Estado está, a meu ver, numa panacéia de valores desviados que vivemos hoje em dia. Os conchavos, negociatas, desgovernos, são apenas alguns atos que observamos como forma de adaptação e banalização, do que se pode chamar de moderno, no modo de vida das grandes cidades. Daquela semana guardamos boas lembranças. A questão da cultura de agora é outra.

A incompetência das instituições, a falência dos órgãos de segurança e a complacência da legislação com criminosos de alta periculosidade determinaram o sucesso das ações de violência que nos trouxe tamanha perplexidade e indignação.

No último domingo o Caderno Mais! da Folha de São Paulo, apresentou uma série de artigos nos quais os autores procuram entender, ou explicar, o fenômeno no ponto de vista do seu campo de atuação. Vale a pena ler.

Um comentário:

Anônimo disse...

Prezados amigos,

leitores do blog de nosso bom amigo Rogério. Pouco ou nada possuo para dizer sobre os acontecimentos. De alguma forma nada pode ser dito sobre acontecimentos. Pode se ter opiniões sobre eles, mas a vaguidão da "opinio", por vezes nos cansa, por precisar ser sempre renovada, num sem fim de comentários. Resta-nos os conceitos, mas esses deixaram de habitar a filosofia, para permear as propagandas de automóveis.

Pois bem. Deixem as opiniões e os conceitos com aqueles que assim desejam. Vamos ficar com tudo aquilo que não é permitido, com todos os comentários que não podem ser feitos, ou, com os movimentos que deixaram de ser conceitos, por seriedade e saudosismo.

Algo não vai bem em nossas crenças, ou, em nossas instituições; a violência e o barbarismo muito se parecem, já dizia Jean François Mattei, cabe-nos perceber que a civilização que resolvemos, adora jantar barbarismo, por ondas de rádio ou balbucios...